O fim do Estado Social e da religião política com a sociedade pós escassez pode estar próximo. Mas onde entra o Metaverso nisso tudo?
O seguinte artigo é de autoria de Renato Amoedo, autor do livro Bitcoin Red Pill: O Renascimento Moral, Material e Tecnológico.
Introdução
Estados social, “Estado de bem estar social”, “Estado Providência“ ou welfare state é a organização política que considera o Estado como ente garantidor e organizador da economia a ponto de condicionar a seu arbítrio e interesse até mesmo a propriedade (vide conceito de fim social como limite e fundamento da propriedade).
No Estado social os cidadãos tem direitos sociais positivos, o Estado teria (em tese, formalmente) dever de garantir direitos como saúde, educação, moradia, aposentadoria e assistência. Tais direitos, em regra, só são exercidos decentemente pelos “amigos do rei” e que custam mais ao Erário do que valem ao beneficiário – aumentando a assimetria de controle e propriedade e, com isso, explodindo a corrupção, a captura administrativa e a carga tributária.
Esse modelo de organização política é insustentável, o que resta provado na prática – com déficits exponenciais e sistemáticos – e em teoria – nas refutações do socialismo de Carl Menger (Teoria subjetiva de valor), Böhm-Bawerk (lei da preferência temporal), Mises (problema do cálculo econômico) e Hayek (problema do uso do conhecimento humano), dentre outros.
A evidência empírica corrobora as demonstrações teóricas mencionadas: quanto maior o controle estatal sobre a economia, mais captura administrativa e distorções, tornando motivações oportunistas dominantes e destruindo a moeda, a moral e as motivações cooperativas – desde o primeiro Estado Social.
A miséria é a condição natural da Humanidade, por séculos, a maioria das pessoas (incluindo idosos e crianças) precisou trabalhar a maior parte do tempo apenas para ter abrigo e alimento, com a explosão de produtividade e riqueza derivadas das Revoluções Industriais (em grande parte resultado de garantias de direitos individuais mitigados com o welfare), o cenário mudou.
Em termos históricos, o número de horas trabalhadas segue uma tendência de queda sistemática por séculos, devido a ganhos de produtividade causados por diversos fatores – tais como ganhos de escala, tecnológicos e aumento nos níveis de investimento e poupança.
O aprofundamento dessas tendências levaria a “desemprego estrutural” (inevitável, provocado por novas tecnologias) para a maior parte da população, que simplesmente não teria qualquer chance de desempenhar trabalho remunerado a custo inferior a sistema automatizado, como argumentam Bill Gates e Elon Musk.
Ray Kurzweil considera a Renda Mínima Universal (RMU) “inevitável” até 2030 (quando computadores teriam inteligência equivalente a humana) e prevê singularidade até 2045, quando computadores superariam a inteligência coletiva da Humanidade.
Mesmo que não haja aumento do desemprego estrutural, a maioria da população do Brasil já é de desocupados (38% ocupados, incluindo ai sub ocupados e ocupados em atividades que não geram qualquer riqueza e só existem devido a regulações) – e, com o envelhecimento sistemático, sem eliminação de regulações e “direitos sociais” como trabalhistas, a tendência é apenas piorar.
Como demonstrado por Olavo de Carvalho no “Jardim das Aflições”, por Jouvenel no “O Poder – história natural de seu crescimento” e nas evidências empíricas confirmando a Lei de Wagner (Lei do Aumento dos Gastos Estatais), a tendência é que Estados aumentem – de maneira absoluta e proporcional – até o colapso da economia privada.
Definido o objeto e o problema, o texto passa a tratar de duas soluções voluntárias e não excludentes para sua resolução: 1) o fim do welfare pela renúncia voluntária de direitos político e sociais (e rendas estatais) por renda mínima mensal; e/ou, 2) o fim do Estado Social pela satisfação plena dos cidadãos de seus desejos através de drogas e simulações.
Ofertar renda mínima universal para os cidadãos que renunciem a exercício de direitos políticos e sociais (que custam ao erário mais do que valem para os beneficiários devido a ineficiências estatais como leaky bucket e dead weight loss) é a maneira de reduzir sistematicamente o Estado social e acabar com estímulos perversos, de maneira voluntária.
Como pagamento alternativo em moeda aos “direitos” seria voluntário e poderia ser a qualquer ano revogado, seria Pareto Ótimo (beneficiando alguns sem trazer qualquer prejuízo aos demais) e propiciaria, em seus efeitos de segunda ordem, ganhos gerais com aumento de produtividade, arrecadação e estímulos cooperativos; e, redução do gasto público, captura administrativa e corrupção.
Como os “direitos” custam mais ao erário que valem para os beneficiários (como nos cursos universitários nas federais que custam 400% do valor de particulares equivalentes), a tendência é que mesmo com o aumento em valor real sistemático da RMU, os gastos públicos fossem sendo sistematicamente reduzidos, como as distorções resultantes dos direitos sociais, aumentando a produtividade e reduzindo a corrupção e dominância de oportunismo.
1) Renda Minima Universal (RMU)
A primeira solução proposta e analisada por este artigo é simples: em vez de uma miríade de benefícios sociais e programas sociais ineficientes que estimulam o oportunismo, o crime e o aumento do Estado (e da corrupção) subsidiando a desocupação e o ócio, se o governo oferecesse alternativa e voluntariamente renda mínima universal (RMU) aos programas existentes, poderia eliminar a pobreza involuntária sem aumentar o gasto público, como já demonstrado com dados do governo, desde 2015.
Atualizando os dados (população e gasto público) usados no trabalho referido, uma renda mínima de mais de R$ 1000 (duas vezes mais que a “linha de pobreza do IBGE”) poderia ser ofertada a qualquer brasileiro que se comprometesse a: 1) cumprir a lei (perdendo o benefício caso tivesse citação/intimação ou execução criminal, civil ou administrativa pendente); 2) renunciar a outras rendas públicas e exercício de direitos políticos e sociais – reduzindo a pobreza que aumentou nos últimos anos, mesmo com os aumentos de gastos sociais – durante os anos que recebesse o benefício.
Se o cumprimento de deveres legais também fosse condicionante, suspendendo pagamento da RMU caso o cidadão em mora com qualquer obrigação judicial ou administrativa, o “custo Brasil” seria reduzido, acelerando processos, facilitando execuções e tornando comportamentos cooperativos dominantes.
Um cidadão que tivesse garantida renda mínima igual ou superior ao “salário mínimo legal“ já teria, em tese, seu mínimo existencial garantido e não haveria motivos para opor que condição para recebimento destes valores fosse a renúncia de direitos sociais (previdenciários, trabalhistas e assistenciais) – inclusive ampliando brutalmente a sua possibilidade de trabalhar e produzir riqueza, livre dos elevadíssimos custos sociais (que impõem taxa mínima de desemprego e desocupação, impedindo jovens e pobres de se qualificar ganhando experiência).
Também não há razão para se opor a sua renúncia de exercício de direitos políticos, primeiro porque não renuncia o direito (apenas seu exercício) e pode voltar a exercê-los a qualquer momento renunciando a renda mínima. Sendo sustentado pelo erário, votar seria tanto julgar em causa própria (e se tal dispositivo se estendesse a aposentados e servidores também reduziria amplamente estímulos oportunistas) quanto estímulo ao oportunismo (sendo que ele preferiu ser recebedor líquido em vez de contribuinte).
Os dados da Lei Orçamentária de 2013 indicavam que, sem aumentar os gastos estatais, apenas dividindo gasto assistencial total da União somado as rendas impróprias pelo número de beneficiários potenciais com renda inferior ao RMU potencial (98 milhões), o resultado foi R$4.996,54 por ano; ou, R$416,37 por mês (o salário mínimo na época era R$678 e a linha de pobreza R$291).
Ou seja, em 2013 já era possível eliminar a pobreza involuntária sem aumento de gasto. Isso sem considerar qualquer acréscimo de arrecadação por efeitos secundários e sem considerar políticas de renda mínima que estados e municípios poderiam igualmente implementar.
A lei orçamentária de 2013 previa R$ 2,16 trilhões de gastos e a de 2021 já é de R$ 4,325 trilhões, a população brasileira cresceu menos de 1% aa nesse período e a atividade econômica, medida por indicadores como PIB, caiu em Dólar elevando a dívida de 60% para 90% do PIB. Com crescimento decrescente da população e envelhecimento exponencial, as perspectivas para as próximas décadas são medonhas.
De 2010 a 2020 o PIB mundial cresceu mais de 40% em US$ – e o do Brasil decresceu mais de 40%.
O aumento da dívida com estagnação do PIB certamente indica uma menor capacidade de implementar políticas por governos e empobrecimento sistemático do país em seu período de bônus demográfico (quando há mais proporção de pessoas em idade produtiva). Ao mesmo tempo, serve de diagnóstico de que as políticas atuais além de ineficazes a combater a pobreza, também garantem a perpetuação da estagnação econômica e institucional.
2) Metaverso e drogas
A solução privada para a pacificação social de massas desocupadas e sem oportunidades políticas ou econômicas é oferecer fuga da realidade cruel: vídeo games, política partidária, fofocas de sub celebridades e de crimes macabros, futebol e esportes (praticados por terceiros), filmes, novelas, BBB, only fans e sex dolls. Todas essas distrações tendem a ser absolutamente superadas por experiências com drogas e/ou realidade virtual (VR/RV) como o metaverso combinadas com tecnologias de interfaces de máquinas com cérebros, como a Neuralink.
A legalização e até subsídio de drogas como política pública é muito clara na epidemia de opiáceos dos Estados Unidos e seu papel para o fim da república. Após 2020 não é mais possível negar o poder político da Big Pharma e sua capacidade de captura administrativa.
Políticas de “Pão e Circo” para pacificação social de massas desocupadas e sem perspectivas de progresso existem há milênios. Porém, com as novas tecnologias eles tendem a atingir novos patamares: se only fans proporcionou vídeos e áudio de mulheres as quais os clientes nunca teriam acesso sem pagar dezenas de vezes mais; sex dolls tem potencial de oferecer, alem de visão e audição, tato e olfato; e a RV com interface de máquina no sistema nervoso tem potencial de proporcionar a experiência plena em todos os sentidos – inclusive superior, em vários aspectos, ao potencial da realidade.
Se a tecnologia de interfaces entre máquinas e sistema nervoso cumprir seus objetivos, logo, as experiências virtuais cotidianas de sexo, comida e relações sociais, em vários aspectos superarão as reais – impactando brutalmente em mercados, vez que inicia a Economia da Abundância em civilização pós-escassez: mercado em que o custo marginal tende a zero, que bilhões de pessoas podem ter a experiência de comer a lagosta (ou possuir a melhor mulher do mundo, ou uma mulher melhor que qualquer mulher que já existiu) vez que essa lagosta é apenas uma simulação (dados).
Na RV com interface com sistema nervoso, você poderá ter a garota dos seus sonhos a sua disposição, ou três delas ao mesmo tempo (com idades diferentes) em seu harém. A tentação para passar o máximo de tempo possível nesses ambientes será brutal – como a dominância econômica e política dos meta capitalistas que as controlarem.
As fugas da realidade – sejam através de ideologias, religiões, simulações ou drogas – sempre foram e tendem a continuar sendo as alternativas privadas para aqueles que se veem sem oportunidades de desenvolvimento, pessoal, econômico ou político.
Kurzweil avisava desde 2012 que se as interfaces entre máquina e sistema nervoso trouxerem ganhos de produtividade, inteligência e rendimento físico, aqueles que se recusarem a receber esses implantes passarão a ser marginais miseráveis apegados a métodos obsoletos – como comunidade amish que prefere viver sem usar energia elétrica.
Para este mesmo autor, o passo seguinte para a perpetuidade seria o download de sua consciência para que pudesse ser baixado em RV, robôs ou surrogates a qualquer tempo ou até simultaneamente. Nessa visão, com o fim do trauma da morte inevitável, a Humanidade estaria livre de religiões convencionais e com o fim da escassez, não haveria mais sentido para considerar relevante “religião política”.
Conclusão, síntese e recomendações:
Como demonstrado, o welfare é insustentável e todas as experiências de Estados sociais terminaram em colapso moral, social e econômico devido as distorções e assimetrias de propriedade e controle que produz. Na usual analogia do condomínio que os porteiros não apenas votam, como são maioria, tendem a sempre votar para que haja aumentos da taxa condominial, dos benefícios e número de porteiros até que o valor de cada unidade seja destruído, os condôminos evadam e o condomínio colapse (exemplificando a “tragédia dos comuns”).
Foram apresentadas duas saídas, não excludentes e voluntárias, para resolver o problema: a) uma pública, em uma proposta para que o governo oferte mesada (RMU) em troca do exercício de direitos políticos, sociais e rendas estatais, em que voluntariamente entes estatais poderiam extinguir gastos sociais gradualmente, renunciando a eles; e, b) uma privada, em que grandes corporações cantilionárias passam a controlar grande parte da população desocupada, mantendo-a em fugas da realidade, seja através de drogas e/ou simulações (como metaverso) onde todas as demandas podem ser virtualmente satisfeitas com custo marginal zero (ou seja, sem o problema da abundância).
Uma vez satisfeitas as necessidades conscientes da maioria das pessoas, elas não têm mais motivação de participar da sociedade política nem de professar “religião política” abrindo caminho para a restauração das democracias em repúblicas – ou oligarquias dos controladores das massas (Big Tech e Big Pharma).
Por séculos, os três principais mercados foram de pessoas (escravos, terra com servos ou venda direta da mão de obra por livres), armas (poder e liberdade) e drogas (prazer e alívio de dor) e as perspetivas indicam que devem continuar sendo, até no metaverso.
A alternativa às soluções voluntárias (apresentadas) é a violência.
A alternativa à política que torne comportamento cooperativo dominante é corrupção e subdesenvolvimento perpétuos.