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Como o Bitcoin vai acabar com a violência do tráfico

Bitcoin e tráfico de drogas

O advento do “dinheiro mágico da Internet” tem potencial de acabar com a violência do tráfico de drogas: tanto em exemplo de uso privado do bitcoin (crypto dealer), propiciando comércio pseudo anônimo de drogas sem violência e com preços e custos abaixo dos praticados no modelo dominante; quanto em efeito de segunda ordem, forçando Estados a descriminalizarem/desregulamentarem mais mercados para aumentar arrecadação, como tem ocorrido nos EUA.

O seguinte artigo é de autoria de Renato Amoedo, autor do livro Bitcoin Red Pill: O Renascimento Moral, Material e Tecnológico.

Introdução

Durante toda História da Humanidade (e parte da Pré História) houve consumo de drogas – sem violência ou repressão durante a maior parte deste tempo.

A capacidade de digerir álcool é anterior aos primeiros humanos. O primeiro milagre de Jesus registrado na Bíblia foi transformar água em vinho restaurando a alegria nas Bodas de Caná (João 2:1-11).

O Brasil tem uma relação idiossincrática com as drogas. Ramos de café e fumo estavam no brasão e bandeira imperiais e estão até hoje no brasão de república. O comércio colonial era baseado na compra de escravos por álcool/tabaco para exportar açúcar para a metrópole em troca de manufaturados. O café só foi introduzido no país no século XVIII e já foi a principal pauta de exportação no século seguinte.

Ou seja, o Brasil colonial se sustentou por séculos de exportação de drogas lícitas (açúcar, álcool e tabaco) que provocam mais mortes e custos em comorbidades que qualquer outra droga (lícita ou ilícita) e a principal pauta de exportação do Império (e da primeira república) foi outra droga, o café, vez que a cafeina é psico-ativo – e foi popularizado devido a proibição do consumo de álcool pelo Islã.

A causa provável das sociedades adotarem sedentarização e agricultura em vez de permanecerem caçadores coletores é o álcool – que por sua portabilidade, durabilidade e alto valor poderiam servir como reserva de valor e de calorias. Logo, para produzi-lo em escala, é necessária a agricultura.

Observando indígenas e suas bebidas fermentadas (como pajuaru, cauim, caxiri e suas variações), fica claro que há produção de drogas até por sociedades tecnologicamente neolíticas – sem qualquer uso de metais. Os povos pré colombianos já faziam amplo uso de diversos enteógenos com finalidades recreativa e ritualística (folhas de coca, peyote, cogumelos e até toxina de sapo eram amplamente usados desde tempos pré históricos).

No Mediterrâneo, há registros de uso de ópio e maconha, desde 1300 AC no Egito e evidência de cultivo desde 3400 AC na Mesopotâmia. Foram encontradas sementes de papoula datadas de 4200 AC em local de enterro (na Cueva de los Murciélagos na Espanha).

Em um breve resumo da História: há evidências de produção pontual de fermentações alcoólicas desde 13.000 AC (e generalizada desde 7000 AC); no século XVI, bebidas alcoólicas passaram a ser estimuladas (através de políticas públicas) por suas propriedades medicinais; em meados do século XVIII o alcoolismo se tornou um problema social, desencadeando os movimentos pela “temperança e moderação” com seu auge na criminalização em 1920, nos Estados Unidos; e, o resultado da criminalização foi a explosão do tráfico ilegal financiando toda economia do crime até a sua revogação em 1933.

A “Guerra as Drogas” deriva de dupla “arrogância fatal” de eleitores e legisladores: moralmente, acreditam que crimes sem vitimas são legítimos e não violam direitos naturais e divinos; assim como, pragmaticamente, não entendem as reais consequências de suas decisões, que são detalhadas a seguir. A proibição aumenta a potência das drogas (terceira lei da demanda), a lucratividade do tráfico, os recursos destinados à economia do crime e reduz os recursos, materiais e humanos, para combater os crimes reais, com vítimas, como estelionato, estupro, roubo e assassinato.

Os resultados da “Guerra as Drogas” são uniformes em dois séculos de repressão a crimes sem vítima: só “ganha” (parcial e temporariamente) essa guerra os governos que se tornam mais violentos e implacáveis que o próprio tráfico – como é claro no caso de Cingapura. Os grandes vencedores são os traficantes violentos (que tem garantida sua reserva de mercado e alta lucratividade) e os demais criminosos (que tem mais uma fonte para alimentar a economia do crime).

Quem deve servir a quem? O governo que serve aos cidadãos ou o contrário?

Se o governo puder decidir quem será preso, expropriado ou morto (se resistir) por consumo ou posse (do que quer que seja) sem dano ou ameaça a terceiro (crime sem vítima) pode-se concluir que não há mais propriedade ou liberdade.

Se o governo puder te proibir de ter/consumir drogas também vai poder te proibir de ter/consumir carne/armas/ouro/imóveis ou qualquer outro bem, está disposto a aceitar isso?

Jesus deixa claro que interferências de terceiros em contratos privados é algo maligno e baseado em inveja, como na parábola dos trabalhadores das vinhas. Mais um exemplo grotesco de “crime sem vítima” é o de “maus tratos a animais”, claramente demoníaco desde o primeiro livro da Bíblia, justificando o poder de governantes e seus prepostos a encarcerar, expropriar e matar (se resistir) quem for acusado de “maltratar“ sua própria propriedade e confirmando a tese que “todas as civilizações que adoraram animais sacrificaram humanos inocentes“

Não é coincidência que a “Guerra as Drogas” tenha sido declarada por Nixon em 1971 – ano que o dólar se tornou moeda puramente fiduciária, fiat.

Solução de Mercado: crypto dealer

Uso de violência custa dinheiro. Manter o ponto de venda de drogas (“boca”) inclui gastos de vigilância, armamento, advogado, arregos (subornos) e repressão de denúncias. Além dos altos custos da “manutenção da boca”, o tráfico de drogas opera com uma espécie de “discriminação perfeita de preços” (como as empresas aéreas que vendem os assentos a preços crescentes).

Existe um grande subsídio cruzado entre usuários recreativos e dependentes. Isso é evidente na venda subsidiada de drogas a usuários recreativos e até na distribuição gratuita de drogas em festas – especialmente a adolescentes. Essa política de fidelização do cliente existe para aumentar a base de dependentes que efetivamente financiam o negócio.

O jogo do bicho não mata clientes porque não efetua venda a crédito. Não havendo “fiado” não é necessário usar violência em cobrança, assim que vai operar o crypto dealer – ou migrando da boca para o comércio virtual, ou adquirindo confiança do mercado oferecendo referral, primeiro pedido grátis (a base de usuários conhecida) e ferramentas de marketing já consolidadas.

Sem os custos de subsidio cruzado, cobrança e manutenção da boca, um “crypto dealer”, um agente que receba pedidos e pagamentos apenas em meios criptografados e efetue entregas sem perder sua privacidade, poderia vender drogas muito abaixo do valor de mercado das bocas, destruindo o modelo de negócio do tráfico violento.

Se as drogas no crypto dealer custarem metade do preço da boca (para dependentes) e forem entregues por drones ou deixadas em lugares públicos informados após o pagamento, todos os usuários dependentes tendem a comprar pela Internet – e também grande parte dos usuários recreativos (mesmo pagando marginalmente mais) pelo incremento em sua privacidade e segurança pessoal, sem ter que ir pessoalmente buscar o produto.

Perdendo os clientes lucrativos, só sobra para a boca os dependentes insolventes (que não tem como pagar) e os recreativos que não pagariam pela droga nem o valor que é cobrado pelo crypto dealer – levando ao colapso das bocas por seleção adversa. Vide “The Market for Lemons” sobre colapso de mercado derivado de assimetria de informação e seleção adversa.

Para que os crypto dealers se tornem dominantes, é necessário que na base de usuários o conhecimento seja dominado de: a) como adquirir e transacionar com criptos; e, b) como utilizar apps de comunicação criptografados e seguros. Este aprendizado tende a ser um processo orgânico e iminente (até porque o usuário tem menor preocupação com privacidade podendo comprar em qualquer plataforma com KYC/AML, enquanto o fornecedor que tem escala e motivos para preservar sua privacidade que assume maior complexidade operacional).

Esse processo pode resultar na obliteração financeira das facções atuais ou no aumento de lucratividade daquelas que adotarem a tecnologia primeiro, reduzindo seu custo, risco, preço – e assim eliminando a concorrência, sem violência.

Um dos primeiros usos comerciais do bitcoin foi compra de drogas online, como no caso do silkroad. Diversos paralelos podem ser feitos, mas de forma resumida, pode-se afirmar que essas primeiras experiências não deram certo, pois: 1) na época não existiam os meios necessários para garantir anonimidade forte na transação (nem meios offchain nem escala onchain, com baixo set de anonimidade) nem havia liquidez relevante das criptos; 2) os vendedores dependiam de distribuição por correios (muitas vezes internacional) em vez de focar no sistema do usuário buscar o produto localmente (reduzindo risco, custo e eventual pena); e, 3) os fornecedores não possuíam meios decentralizados e seguros de comunicação, como existem hoje até apps de chat privado decentralizados; 4) as ofertas eram feitas abertamente, para qualquer um – e não a usuários conhecidos e suas indicações por referral.

Responda as seguintes questões e entenderá se é viável: 1) perfil anônimo sem número (acessando a net por VPN) manda uma mensagem com tabela de preços e produtos, o primeiro é grátis, o usuário pede? 2) entregue com foto, ele busca em local público próximo (ou jogado por drone em sua varanda ou quintal)? 3) provando qualidade superior, e risco pessoal e preços inferiores, ele passa a consumir exclusivamente do crypto dealer ou vai voltar a subir o morro arriscando ser “esculachado”na subida ou descida? 4) recebendo percentual de crédito por indicação o “sacizeiro” vai mandar o cardápio para seus colegas informando onde cada um deles mora e quem é?

Exemplo de cardápio de drogas online.
Exemplo de cardápio de drogas online.

Solução de Estado

A descriminalização (com regulamentação) também é uma tendência nos últimos anos. Com a erosão tributária derivada da adoção das criptomoedas e da elevação de tributos e regulações a níveis que violam até mesmo a curva de Laffer, 36 estados americanos e DC já legalizaram uso recreativo ou medico da maconha, com o mercado aumentando 45% em 2020.

Revisão de literatura sobre as consequências da legalização nos EUA indica que, na maioria dos casos, o aumento da arrecadação tributária foi superior aos modelos mais otimistas.

Evidências históricas também corroboram esse fato: até 1929 Coca-Cola continha cocaína, cocaína também era vendida pura em catálogos (como da Sears) até 1895, o próprio Freud (também usuário) prescrevia cocaína como cura de depressão e dependência a morfina – e registra em sua obra “cocaine papers” como venceu seu vício.

Existem registros históricos de dependência de droga em ambientes sem criminalização, com destaque para o ópio na China ou na Guerra Civil Americana (distribuída por ambos os lados como medicamento, como principal opção de alívio da dor), os surtos de dependência eram correlacionados a crises/guerras.

A experiência dos soldados americanos no Vietnã (em que a maioria admitiu usar drogas na campanha e mais de 20% heroína diariamente) também serviu de mais um caso em que a proibição e as prisões em massa pelo consumo de maconha causou aumento do consumo de drogas mais pesadas (sem cheiro e mais fáceis de ocultar) como heroína e cocaína.

Como milhares de usuários cotidianos (seja de maconha, cocaína, LSD, tabletes de anfetaminas ou mesmo os sedativos fornecidos pelo próprio governo) deixaram o vício sem qualquer tratamento, após voltar para atividade produtiva na vida civil, ficou claro que o principal fator para a dependência é social – e não genético – como confirmado pelas “teorias dos vícios”, como o Rat Park canadense.

A disponibilidade (risco e custo de obter droga) é menos relevante para o número de dependentes (e suas externalidades) que as oportunidades de desenvolvimento social e econômico – como fica muito claro quem qualquer cadeia.

Outra política pública respeitando o PNA que teria efeito análogo (ou superior a depender da escala) aos crypto dealers para eliminar as externalidades do tráfico violento (e de todos crimes resultante) seria a distribuição gratuita de drogas (ou bioequivalente) para dependentes se manterem confinados – não há como concorrer com produto igual ou superior grátis.

Conclusão

A proibição de ópio na China, justificada para combater déficit na balança comercial, terminou com derrotas humilhantes das Guerras do Ópio. A “Guerra das Drogas” de Nixon, declarada no mesmo ano que os EUA abandonam o padrão ouro, provocou explosão no uso e potência das drogas usadas nos EUA – inclusive na epidemia de opioides (incluindo fentanyl chinês) que segundo dados oficiais já resultou em mais de 500 mil mortes por overdose entre 1999-2019 (dobrando por década, 2019 já foi maior que as baixas americanas em 20 anos no Vietnã):

Gráfico das mortes por overdose nos EUA
Mortes por overdose de drogas nos EUA de 1999 a 2019. Fonte: CDC

Por milênios, drogas foram usadas sem criar os níveis de dependência observados atualmente. E, em todos os casos que houve repressão, a potência das drogas explodiu, como a lucratividade e a violência dos traficantes. Quem compreende a Terceira Lei da Demanda (teorema de Alchian Allen ou efeito Alchian Allen), entende a “Lei de Ferro da Proibição” que explica que “nunca existiria crack sem proibição de cocaína”, não existiria skank sem proibição de maconha e se açúcar for proibido na boca não vai vender açúcar cristal – e sim caramelos e leite condensado (com mais potência por grama) pela mesma razão que Al Capone não vendia cerveja – mas sim whisky e licores (spirits).

A proibição provoca a criação e popularização de variantes mais potentes e garante lucratividade aos traficantes mais violentos, aumentando os recursos destinados a economia do crime – incluindo corrupção política, judicial, policial, tráfico/aluguel de armas e pessoas decorrente do tráfico de drogas. Todo financiamento para essa economia do crime cessa com a desregulamentação, com qualquer um podendo produzir e vender qualquer droga, não há qualquer vantagem competitiva para o uso da violência (que é custo marginal).

A tendência – com a descriminalização por governos em busca de aumento de arrecadação e dos crypto dealers vendendo localmente drogas usando comunicação e pagamento pseudo-anônimos – é acabar com o modelo atual de tráfico violento na próxima década.

Outros fatores corroboram com o fim do modelo do tráfico violento: monitoramento facial ostensivo, CBDCs (como o Pix) eliminando moeda alodial (cédulas e moedas) e promovendo totalitarismo financeiro e uso de Big Data e novas tecnologias por governos e órgãos policiais. Logo qualquer policial poderá levantar todos os registros do Pix de suspeito e consultar suas ligações/metadados (incluindo coordenadas de GPS) e confirmando esses dados com as imagens do mesmo das câmeras nas vias públicas. Quem for para a boca vai ser visto, quem pagar ou receber dela por Pix será identificado, quem estiver com celular no mesmo ambiente de alguém que esteve lá será incluindo na árvore de monitoramento.

Resta saber qual dos dois setores (regulado ou não regulado) vai ocupar maior fatia do mercado.

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